O homem se queixa da natureza, mas ele é o grande responsável pelas
mudanças que nela ocorrem. O desenfreado desmatamento verificado em
grandes áreas para criação de gado, em vários municípios da região
sisaleira, apresenta a dura resposta da natureza: só entre os municípios
de Queimadas e Ponto Novo, cerca de 80 km, pode-se contar, nas pontas
dos dedos, o numero de árvores existentes.
A consequência não poderia ser outra: os rios Itapicuru Açu e
Itapicuru Mirim, parecem se despedir da terra por ela sugada devido à
prolongada seca e a retirada de suas águas para irrigação de pastagens
de forma clandestina. Ao longo das fazendas carcaças de animais, que
fartam os urubus, são elementos de uma pintura surrealista capaz de
assustar e abalar o mais empedernido coração.
Na fazenda Salina no município de Queimadas, foram 400 bovinos
mortos. Na fazenda Xique-Xique, outra próxima, mais 100 animais. As
perdas são proporcionais ao tamanho de cada propriedade e à quantidade
de animais nelas existentes. Durantes os dias (14, 16 e 18/3) a
reportagem da Tribuna da Bahia percorreu os municípios de Valente, São
Domingos, Nova Fátima, Gavião, Capim Grosso, Santa Luz, Queimadas,
Nordestina, Ponto Novo, Candeal e Conceição do Coité, para verificar a
situação, em função da estiagem e pode registrar a dramaticidade da
situação.
As perdas são incalculáveis e o desespero está estampado na
fisionomia de cada criador. Ninguém sabe o que fazer mesmo com os
programas de ajuda dos governos.
Sem água

Como diz o ditado que “toda ação provoca uma reação” e a barragem de
Pedras Altas no município de Capim Grosso, no leito do rio Itapicuru
Mirim, responsável pelo abastecimento de 173 comunidades de 21
municípios com 12 sedes, está sete metros abaixo do nível normal e
ameaça deixar mais de 200 mil pessoas que residem nos municípios de
Capim Grosso, Gavião, Nova Fátima, Riachão do Jacuípe, Ichu, Candeal,
Queimadas, Santa Luz, Valente, São Domingos, entre outros, sem água
potável, devido o racionamento inevitável que deverá acontecer a
qualquer momento, se não ocorrerem chuvas de trovoadas nos próximos dias
na região, para amenizar a situação que é bastante preocupante.
O mesmo acontece com a barragem do rio Itapicuru Açu em Ponto Novo,
onde a economia regional está seriamente abalada e deve receber um forte
golpe nos próximos dias, caso o governo estadual tome a decisão de
suspender o fornecimento de água para a irrigação do plantio de 1.100
hectares de bananeira.
Na semana passada, o manancial liberou 12 descargas de águas para
alimentar o leito do Itapicuru Açu e encher a barragem da Leste
Queimadas. A reportagem da TB esteve nessa segunda-feira (18), à tarde,
na represa da Leste e constatou que as águas de Ponto Novo ainda não
haviam chegado e a barragem continuava vazia.
A represa de pedra e cimento construída nas terras de Santo Antônio,
padroeiro de Queimadas, atende 70 mil moradores que no município e na
cidade de Santa Luz, além de propiciar o abastecimento de 120 carros
pipa/dia, que levam água aos flagelados da seca em seis municípios.
Economia esfacelada

Os criadores sisaleiros parecem não entender a mensagem, mas a
desertificação toma conta de toda região. Cortada por 19 km de rio
Itapicuru Açu e Itapicuru Mirim, a fazenda Salina, em Queimadas, com 10
mil tarefas de terra, 8 mil de pastagens e 2 mil de preservação de
caatinga é um exemplo do desmatamento.
O administrador da propriedade Luiz Gonzaga da Silva, disse que a
grande causa de morte das 400 cabeças de gado é a fome. “Estamos com
três anos de seca e não existe nada para os animais comerem nos pastos.
Só não morreu mais gado por causa das duas mil tarefas de caatinga que
foram preservadas por conta da Lei ambiental. Se não fosse isso muitos
mais animais teria morrido e os prejuízos poderiam ultrapassar R$ 500
mil”, explicou.
Segundo Carlos Jesus do Nascimento (Guri), vaqueiro da fazenda
Xique-Xique, já morreram 100 animais. Ele acreditava que o mandacaru que
existia em grande quantidade na propriedade não acabaria nunca e hoje,
para alimentar o rebanho, o produto vem sendo adquirido no município de
Valente. Explica que um caminhão da planta alimenta 600 animais durante
uma semana, com direito a uma ração por dia.
O zelador da fazenda Paraíso comentou que das 200 bovinos existentes
na propriedade 20 morrem de fome e o restante foi levado para outras
regiões para não morrer à míngua.
A situação de miséria, em que vive a região sisaleira, na opinião do
ambientalista Valdir Fiamoncini, decorre do fator climático, redução das
chuvas, da supressão da vegetação nativa para implantação de grandes
áreas de pastagens como monocultura, em sua quase totalidade com a
eliminação da mata ciliar dos rios e grandes açudes.
Com isso, um processo rápido de desertificação está implantado na
região, onde a camada que protege o solo e carreada para os rios e
açudes, provocando o assoreamento dos mesmos e diminuindo a capacidade
de armazenamento de água. “Se não houver a preservação do que resta da
vegetação e a recuperação das áreas degradadas corre o risco de dentro
de mais alguns anos não existir mais o bioma caatinga, o que trará
sérias consequências aos homens e animais” diz.