
“Você é muito bonita, morena”, ouviu Mirian de um homem que tentava cortejá-la. “Morena, não, que isso não existe. Eu sou uma negra bonita!”, foi o que respondeu ela, filha da comunidade quilombola do Gavião, em Antônio Cardoso, a 145 quilômetros de Salvador, um tanto Agreste e um tanto Sertão. Hoje, Dia da Consciência Negra, e em todos os outros dias do ano, Mirian Jorge de Almeida, 29 anos, não tem qualquer pudor de se afirmar como de fato é: “Sou negra, forte, independente e trabalho para que os negros tomem conhecimento do valor de sua história”. Na cidade em que Mirian nasceu, mais da metade dos moradores já conhece o valor de sua história. Para ser mais preciso, 50,65% dos 11.554 habitantes de Antonio Cardoso se declararam negros no último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2010. O percentual coloca o município como único de todo o Brasil em que a maioria da população se vê (e se diz) negra.
“Era pra ser muito mais. Cansei de entrevistar negros que ainda têm vergonha e se declararam pardos. Não podemos influenciar na pesquisa, só damos as opções”, revela a professora de redação Elaine Aragão, que atuou como agente de pesquisa do Censo. Em Antônio Cardoso, a soma do percentual de pessoas que se declararam negras e pardas alcança 91,67%, oitavo do país. “Uma senhora disse assim: branca eu não sou, nem indígena. Preto é o cão. Então coloque parda”, lembra Elaine, não sem lamentar.
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